terça-feira, 9 de novembro de 2010

Marca d'lágrima

    Há dias já me abateu o desejo de escrever-vos esta pequena passagem. Faltava, porém, disposição e a inspiração necessária para que eu pudesse sentar-me e dedicar ao teclado as letras aqui dispostas. Contudo; minha preguiça foi vencida pela inconstância do meu cérebro em por as vozes do inconsciente pra fora. 
    Um relógio digital piscava no alto de uma parede. Na pressa da multidão meus passos se confluíam no som que as outras pegadas invisíveis deixavam no concreto. O trem já estaria chegando. Enquanto ele não chegara, procurei um lugar a fim de descansar meu corpo. Avistei um assento e fui a sua direção. Sentei. Ao meu lado, o vazio me acompanhava. Quanto invisíveis somos no meio de tanta gente! De repente, uma moça magra de traços sutis sentou apressada ao meu lado. Pôs a mão no rosto e começou a chorar.
    Nesse momento, um grito de desespero invade a minha alma. Por que a moça estaria chorando? Fiquei imóvel. Ela, coitada, gemia em soluços paulatinos. Fungava. Tremia. Chorava. Sua dor me comoveu. Mas uma força, dessas que só aparecem nos momentos mais indesejáveis, calava-me. À toa. Deveria lhe oferecer ajuda? Mas se ela não gostasse? Se achasse uma intromissão, uma falta de respeito, um entrar em assuntos que não me interessavam? Fiquei calado. Por mais que gritasse, ninguém me ouvia.
    A moça parou de chorar. Retirou de sua bolsa um lenço que levou aos olhos, que já estavam secos de lágrimas. Ficou séria, um pouco rubra. Em sua volta dezenas de corpos a olhavam paralisados. Pareciam frias estátuas de madeira. Bonecos de bronze. E eu era um desses. Uma nova lágrima caiu no chão. Dessa vez sem tantos soluços, mas silenciosamente, cortante. Ela voltara a chorar e eu, insignificantemente, permaneci estático. Um barulho se aproximava. Movimento na estação.
    Como a viajem era longa, procurei um assento, de preferência próximo à janela, onde as imagens distraíam-me e diminuiam o trajeto. Porém, do vidro embaçado apenas extraia-se o vulto da jovem que permanecia enxarcando as mãos. Todavia, mesmo com a sua sombra esvaindo-se à medida que a máquina de ferro rachava os trilhos, ficou intacta em minha alma uma marca de uma lágrima.

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