quarta-feira, 13 de março de 2013

às vezes me atrevo na prosa...


Lembro de uma vez quando contava com sete anos. De minha irmã, cortando as paredes de minha rua com o seu grito. Nome e sobrenome acompanhado de "venha tomar seu banho que já é tarde!" Doces suspiros de insônia invadem meu peito, já a essa hora. Que me trazem essas memórias senão doces suspiros de insônia? Aos poucos, o tempo passa e evolui. Lembranças são moldadas e dirigidas àquilo que chamamos de nosso destino. Moldada: gosto dessa palavra. Me lembra barro e mãos. E um produto final bem produzido. Ou não. Depende do talento, das mãos e da velocidade do processo. Moldada. Minha vida segue moldada a rumos que nem eu pudera antes disto tudo ousar-me prever. O sítio simples com três ou quatro caprinos, um papagaio de parede e uma parede branca. Que lua medonha faz hoje, veja. A lua me traz lembranças de medo de lobisomens e de almas penadas. Quem pode controlar a imaginação de uma criança, ora. Subitamente me afasto dessas coisas – procuro um copo d’água e um lugar onde vente. Já não vale mais a pena essas pessoas. Tenho amigo adoráveis, digo, adoráveis. Sim, sim. Fomos ao teatro. Dois passos, risadas, bar. Eles vivem tão distante. Pensam tão distante. Flutuam em uma necessidade talvez não necessária. Necessito ir urgente ao dentista. Minha blusa de botões azul. Alguém deve salvá-los. Alucinados vivem na fantasia que constroem. Não conseguem palpar uma realidade tão palpável. Absorva-os. Faço um conto que amarre minha loucura. Meu Deus, porque sou tão diferente? Compensai minha diferença dos demais com coisas e pessoas ou pessoas adaptáveis. Não entendo a burocracia pré-meridional neocontemporânea e mesocosmopolita. Ela nos afasta do que somos. É como se lambuzar de mel e não sentir o doce gosto. Mas sentir por observação alheia. Fingir ser, sabe. Porque somos então? Troque de CD, prefiro Pixinguinha. Meus conhecidos sentem pena de mim. Não dizem, nem declaram; mas posso ver. Coitados, foi o que eu disse ao descer a minha rua, só. Coitados. Preciso trocar as pilhas do meu relógio, atrasa, não é ainda meia-noite, duvido. Um show de cultura popular sempre me desperta algo. Gosto de café frio e parece que ando amando uma menina. Ela usa calça jeans. Sorri, e eu também. Mas porque eles fazem tantas perguntas? Tenho que dedicar mais do meu tempo àquilo que me interessa. Viagens, projetos literários, poesia e mais uma xícara de café. Coisas óbvias que, porém, ninguém vê. Nega-se de repente por essência. Talvez aquela psicologia freudiana que tanto me agrada me acalente à noite. Aquele frio solitário em meu peito. Porque não? Dúvidas, dúvidas, dúvidas! Porque tanto me perseguem? Me lembro do Recife e de novos amigos a conhecer. Poderia. Poderia me mudar, recomeçar minha vida, criar galinhas no quintal. Eu queria conhecer mais aquela jovem poetisa da outra rua, que sempre tem água escorrendo. A rua. Poderíamos sair, não? Cantar por aí. Não canto em canto nenhum. Nem na China. Tenho que rever os papéis da minha aula. Preparar assunto, refazer adolescentes rebeldes, criar pais. A ciência tem e não teme à necessidade de explicação. Aqueles meus amigos! Minha mente é um turbilhão de tempestades e todo raio insiste em cair no mesmo lugar. Minha crise existencial, meu sopro de inconsciência, minhas sessões de meditação indiana: preciso dedicar mais tempo. E a mim mesmo. Porque pouco a pouco, dia a dia, deixamos de ser os mesmos. Está na hora de você aceitar, crescemos. Amo minha nova cidade, tenho amigos distintos e afazeres que muitas vezes compensam novas frustrações. Me recorda agora, aquela doce atriz que conheci. Sorria com os cabelos, e eu também. Meu coração, coitado, batia feliz, quando a via não sei o porquê. Coitado. Deve ter casado já. Há anos não me manda um convite para um novo espetáculo. Fomos ao teatro.

Rivaldo Júnior