sábado, 23 de junho de 2012

poema pra rosa






rosa, que fala,
que cala e consente
me diz, a semente
que faz-te chorar...

vão dizer que os poetas nada mais são hoje em dia
que o fruto das atividades
cada vez mais necessárias
de técnicas de jardinagem.

ah, rosa.
janela que venta na friagem.
sai daí pra não pegar gripe, menina.
cuida, rosa, venha amarrar as fitinhas de nosso senhor do bonfim
quem tem mais valor.
envelhecer é santo.

o cravo desmaiado é pura enganação.
rosa chora por que ele vem mais não.
não mais pra ali. 
Rivaldo Júnior

Fogo sem fuzil (Luiz Gonzaga)






Eu esse ano vou me embora pro sertão,
Pra dançar pelo São João, farrear com mais de mil...
Ver os velhotes atirar de granadeiro
E a moçada no terreiro tira fogo sem fuzil!


E a meninada brinca de "ané",
Pamonha e café sempre na mesa.
E as moreninhas pra servir com alegria
Quando for no outro dia
Tem buchada com certeza.


segunda-feira, 18 de junho de 2012

poema do bêbado claustrofóbico






sinto-me condenado ao tempo.
quando tempo há em mim.
fim.
entende?
the end.
sim.
sente... ainda é cedo.
e meu medo corre aqui.
entre o entre e o agora.
agora...
que seja.
mais uma cerveja por favor.
faça o favor.
 


Rivaldo Júnior 

sexta-feira, 8 de junho de 2012

reinados e impérios da américa portuguesa




assim terei
teu rei
de roma.
do coma inacabado.
não sei.
a ceia,
o sangue que corre na veia
no vil vinho volumado.
antena de televisão.
a cruz se finca ao chão.

o fato rompeu a louca lei da soma.
some-te-me daqui!

Rivaldo Júnior 

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Se os tubarões fossem homens (Bertold Brecht)



Se os tubarões fossem homens, perguntou a filha de sua senhoria ao senhor K., seriam eles mais amáveis para com os peixinhos?

Certamente, respondeu o Sr. K. Se os tubarões fossem homens, construiriam no mar grandes gaiolas para os peixes pequenos, com todo tipo de alimento, tanto animal quanto vegetal. Cuidariam para que as gaiolas tivessem sempre água fresca e adotariam todas as medidas sanitárias adequadas. Se, por exemplo, um peixinho ferisse a barbatana, ser-lhe-ia imediatamente aplicado um curativo para que não morresse antes do tempo.
Para que os peixinhos não ficassem melancólicos haveria grandes festas aquáticas de vez em quando, pois os peixinhos alegres têm melhor sabor do que os tristes. Naturalmente haveria também escolas nas gaiolas. Nessas escolas os peixinhos aprenderiam como nadar alegremente em direção à goela dos tubarões. Precisariam saber geografia, por exemplo, para localizar os grandes tubarões que vagueiam descansadamente pelo mar.
O mais importante seria, naturalmente, a formação moral dos peixinhos. Eles seriam informados de que nada existe de mais belo e mais sublime do que um peixinho que se sacrifica contente, e que todos deveriam crer nos tubarões, sobretudo quando dissessem que cuidam de sua felicidade futura. Os peixinhos saberiam que este futuro só estaria assegurado se estudassem docilmente. Acima de tudo, os peixinhos deveriam rejeitar toda tendência baixa, materialista, egoísta e marxista, e denunciar imediatamente aos tubarões aqueles que apresentassem tais tendências.
Se os tubarões fossem homens, naturalmente fariam guerras entre si, para conquistar gaiolas e peixinhos estrangeiros. Nessas guerras eles fariam lutar os seus peixinhos, e lhes ensinariam que há uma enorme diferença entre eles e os peixinhos dos outros tubarões. Os peixinhos, proclamariam, são notoriamente mudos, mas silenciam em línguas diferentes, e por isso não se podem entender entre si. Cada peixinho que matasse alguns outros na guerra, os inimigos que silenciam em outra língua, seria condecorado com uma pequena medalha de sargaço e receberia uma comenda de herói.
Se os tubarões fossem homens também haveria arte entre eles, naturalmente. Haveria belos quadros, representando os dentes dos tubarões em cores magníficas, e as suas goelas como jardins onde se brinca deliciosamente. Os teatros do fundo do mar mostrariam valorosos peixinhos a nadarem com entusiasmo rumo às gargantas dos tubarões. E a música seria tão bela que, sob os seus acordes, todos os peixinhos, como orquestra afinada, a sonhar, embalados nos pensamentos mais sublimes, precipitar-se-iam nas goelas dos tubarões.
Também não faltaria uma religião, se os tubarões fossem homens. Ela ensinaria que a verdadeira vida dos peixinhos começa no paraíso, ou seja, na barriga dos tubarões.
Se os tubarões fossem homens também acabaria a ideia de que todos os peixinhos são iguais entre si. Alguns deles se tornariam funcionários e seriam colocados acima dos outros. Aqueles ligeiramente maiores até poderiam comer os menores. Isso seria agradável para os tubarões, pois eles, mais frequentemente, teriam bocados maiores para comer. E os peixinhos maiores detentores de cargos, cuidariam da ordem interna entre os peixinhos, tornando-se professores, oficiais, polícias, construtores de gaiolas, etc.
Em suma, se os tubarões fossem homens haveria uma civilização no mar.