sábado, 26 de fevereiro de 2011

Quando vier a primavera (Alberto Caeiro)

Quando vier a Primavera,   
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
 
 
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
 
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.
 

Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.  
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.  
O que for, quando for, é que será o que é.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Síndrome

Ao avesso
Um sentimento
Esquecimento
Que aquece
Queima
Teima
Em bater a porta da frente.

Um barulho
Um zunido perdido no tempo
Em que tempo?
Temporal.
Um trovão
Solidão
Metalinguagem da alma.

Perco-me em mim mesmo
Alguém me viu?
Onde estou?
Não sei.
Quem se importa?

Rivaldo Júnior

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Lucky (Jason Mraz)

Do you hear me, I'm talking to you
Across the water across the deep blue ocean
Under the open sky oh my, baby I'm trying

Boy I hear you in my dreams
I feel you whisper across the sea
I keep you with me in my heart
You make it easier when life gets hard

Lucky I'm in love with my best friend
Lucky to have been where I have been
Lucky to be coming home again
They don't know how long it takes
Waiting for a love like this
Every time we say goodbye
I wish we had one more kiss
I wait for you I promise you, I will

Lucky I'm in love with my best friend
Lucky to have been where I have been
Lucky to be coming home again
Lucky we're in love in every way
Lucky to have stayed where we have stayed
Lucky to be coming home someday


And so I'm sailing through the sea
To an island where we'll meet
You'll hear the music, feel the air
I put a flower in your hair

And though the breeze is through trees
Move so pretty you're all I see
As the world keep spinning round
You hold me right here right now


Lucky I'm in love with my best friend
Lucky to have been where I have been
Lucky to be coming home again
Lucky we're in love in every way
Lucky to have stayed where we have stayed
Lucky to be coming home someday

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Epifania Íntima

A ordem semicondutora de tudo se altera. 
O pólo sim,
O pólo não.
A desordem dos fatores
Dos meios comuns a qualquer homem
E o produto inalterado.
Miscigenado.
Metamorfoseado.
Desfigurado pelo tempo,
Pelos grãos que caem da ampulheta
Maldita transformação
E maldita atração dos opostos
Bendita transformação.
É ela que nos leva ao delta da vida:
A fase final menos a inicial.
Uma fase nova.
Trezentas e sessenta e cinco fases novas
Ou uma fase crescente
Ou minguante
Ou cheia,
Ou fase vazia.


Rivaldo Júnior

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Os três mal-amados (João Cabral de Melo Neto)

                                             O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
       O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus.
                              O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
 O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
                   O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
        Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
                                           O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
     O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
                     O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
                            O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
  O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
                                             O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

O eco (Guilherme de Almeida)

"Perguntei à minha vida:
Como achar a apetecida
felicidade absoluta?
E um eco me disse:
                                    - Luta!

Lutei. 
Como hei de a esta pena
dar cadência serena
 que suaviza, embala e encanta?
O eco, então, me disse: 
                                  -Canta!

Cantei.
Mas, como, num verso,
resumir todo o universo
que em mim vibra, esplende e clama?
Então o eco me disse:
                                    - Ama

Amei. 
Como achar agora
a alma simples que eu pus fora
pelo prazer de buscá-la?
O eco, então, me disse:
                                   - Cala!

Calei-me. 
E ele, então, calou-se.
Nunca a vida foi tão doce...
Tudo é mais lindo a meu lado:
Mais lindo, porque calado." 

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Jogo de Cartas


Quando menos se espera
uma carta sai da manga
um novo ás 
uma nova esperança
porque esperar não é querer muito
é fazer acontecer
e ser o que se é,
e o mundo vai continuar girando
sempre.  
  Rivaldo Júnior