quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Esperar não é saber


         Embora a concepção sociológica afirme que o homem é produto do meio em que vive, cabe ao ser social a forma como ele interagir-se-á com a realidade da qual faz parte. E é nessa sociedade, cada vez mais plural e dinâmica, que o indivíduo constrói a base das suas decisões. Portanto, os diferentes ângulos de observação dos fatos e posições refletem a multiplicidade de opiniões e atos que formam o caleidoscópio social que nos abriga.
         A comunidade humana, cada vez mais heterogênea, é fruto de decisões importantes e momentos essenciais. Essas situações, nem sempre favoráveis à posição da maioria, foram fundamentais no processo de construção do mundo atual e suas interpretações dependem do modo como são encaradas. De forma natural, o homem começa a perceber que existem maneiras diferentes de observar as ocasiões e a partir do momento que ele aplica esse pensamento no seu dia-a-dia, surge-se as primeiras ideias e manifestações que lapidaram a história da humanidade.
         A realidade atual, por sua vez, apresenta características geradas pelo processo de modernização das civilizações. A desigualdade socioeconômica, a exploração demasiadamente irresponsável dos recursos naturais e a subordinação intelectual da massa em frente a governos manipuladores, por exemplo, cegam qualquer ótica positiva sobre esses aspectos. Porém, a imprudência não justifica a complacência. É necessário por em prática o ponto de vista crítico e agir de forma determinante, de modo que as irregularidades possam ser revertidas e a mudança maior seja a crença na realização de um futuro melhor. 
         É vã a esperança em um futuro melhor, se pouco for feito para mudar o presente. A vontade e a harmonia do homem e das coisas visualizando o amanhã serão as engrenagens da transformação do homem e do planeta. Todavia, esperar não é saber, quem sabe faz a hora, não espera acontecer.


Rivaldo Júnior

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Os oím do meu amor



 
Ê nunca mais eu vi 
Os oím do meu amor 
Nunca mais eu vi 
Os oím dela brilhar 
Nunca mais eu vi 
Os oím do meu amor 
São dois jarrinho de flor 
E todo mundo quer cheirar

domingo, 23 de janeiro de 2011

Dona Cila (Maria Gadú)

De todo o amor que eu tenho
Metade foi tu que me deu
Salvando minh'alma da vida
Sorrindo e fazendo o meu eu.


Se queres partir ir embora
Me olha da onde estiver
Que eu vou te mostrar que eu to pronta
Me colha madura do pé.


Salve, salve essa nega
Que axé ela tem
Te carrego no colo e te dou minha mão
Minha vida depende só do teu encanto
Cila pode ir tranquila
 
Teu rebanho tá pronto.


Teu olho que brilha e não para
Tuas mãos de fazer tudo e até
A vida que chamo de minha
Neguinha, te encontro na fé

Me mostre um caminho agora
Um jeito de estar sem você
O apego não quer ir embora
Diaxo, ele tem que querer

Ó meu pai do céu, limpe tudo aí
Vai chegar a rainha
Precisando dormir
Quando ela chegar
Tu me faça um favor
Dê um banto a ela, 
que ela me benze aonde eu for

O fardo pesado que levas
Deságua na força que tens
Teu lar é no reino divino
Limpinho cheirando alecrim

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Talvez




Três lágrimas
Um sorriso amarelo
uma promessa -
Talvez amanhã...

ou não.



Rivaldo Júnior

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Mucuripe (Fagner)

As velas do Mucuripe
Vão sair para pescar
Vão levar as minhas mágoas
Pras águas fundas do mar
Hoje à noite namorar
Sem ter medo da saudade
Sem vontade de casar
Calça nova de riscado
Paletó de linho branco
Que até o mês passado
Lá no campo inda era flor
Sob o meu chapéu quebrado
Um sorriso ingênuo e franco
De um rapaz moço encantado
Com vinte anos de amor
Aquela estrela é bela
Vida vento vela leva-me daqui
Aquela estrela é bela
Vida vento vela leva-me daqui

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Bicarbonato de soda (Álvaro de Campos)

Súbita, uma angústia...
Ah, que angústia, que náusea do estômago à alma!
Que amigos que tenho tido!
Que vazias de tudo as cidades que tenho percorrido!
Que esterco metafísico os meus propósitos todos!
Uma angústia,
Uma desconsolação da epiderme da alma,
Um deixar cair os braços ao sol-pôr do esforço...
Renego.
Renego tudo.
Renego mais do que tudo.
Renego a gládio e fim todos os Deuses e a negação deles.
Mas o que é que me falta, que o sinto faltar-me no estômago e na
circulação do sangue?
Que atordoamento vazio me esfalfa no cérebro?
Devo tomar qualquer coisa ou suicidar-me?
Não: vou existir. Arre! Vou existir.
E-xis-tir...
E--xis--tir ...
Meu Deus! Que budismo me esfria no sangue!
Renunciar de portas todas abertas,
Perante a paisagem todas as paisagens, Sem esperança, em liberdade, sem nexo,
Acidente da inconseqüência da superfície das coisas,
Monótono mas dorminhoco,
E que brisas quando as portas e as janelas estão todas abertas!
Que verão agradável dos outros! Dêem-me de beber, que não tenho sede!

domingo, 16 de janeiro de 2011

Saudades póstumas


         No centro de tudo eu. E o que é tudo? Os meus olhos não conseguem ver nada. O Chão é claro, branco. O Teto, não muito alto, é tão alvo quanto o solo. As Paredes de tão longes parecem inatingíveis. E no centro de tudo eu. Uma angústia começa a afligir-me. Meus olhos ardem. Não conseguem distinguir Chão, Parede e Teto desse enorme salão branco. Cima e embaixo.
         De repente grandes objetos metálicos se aproximam com uma velocidade indelicada. São enormes esferas de chumbo. Elas giram em um balé desordenado, imitando as órbitas elípticas dos planetas. E eu no centro como o Sol. Em um movimento de aceleração constante elas se emparelham e rodam ao meu torno. E, de forma espiral, se aproximam de mim. Tenho medo, mas estou aqui. E daqui não posso fugir. Tenho que agüentar, sê forte. Grito. As esferas param. E de dentro delas sai um barulho ensurdecedor. Um ruído que me incomoda. Que me enlouquece. Me desorienta. Grito. Elas se afastam. Calam-se. Param.
         Começo a correr nesse espaço inexplorável. Quanto mais eu corro, mais perdido fico em meio ao nada. Tento encontrar as Paredes mas começo a perceber que elas não existem. Caio e deito no chão. Um líquido arroxeado, viscoso e grosso começa a brotar do Teto. Infiltra e cai em gotas rápidas. Em todas as partes, essa substância escorre e se acumula no Chão. Curioso, toco nesse material. Uma sensação terrível passa por mim. Uma queimadura. Um choque elétrico. Um calafrio. Afasto-me. Porém o líquido começa a se acumular, e a avançar sobre mim. Não tenho para onde correr. O nível me alcança e vai lentamente tomando meu corpo. Dói. Fere. Começo a chorar. Inutilmente. Quanto mais me debato, mais torturado eu sou. Sofro. O nível, e sua sensação medonha, alcançam meu pescoço. Olho angustiado pro Teto. Não sinto meu corpo. O líquido lentamente vai tomando minha boca. Meu olhar firme treme por alguns segundos. Afogo-me.
         O cheiro das velas e das flores incomoda meu nariz. Com as costas das mãos, enxugo meu rosto inchado. Derramo minha última lágrima. Minha vida acabou. Naquele caixão jaz toda a minha vida, o meu amor. No meu coração resta apenas um vazio imenso, cheio de saudade.

Rivaldo Júnior

O abacateiro


Ontem,
Atrás da minha casa havia um grande abacateiro
Sua sombra cobria todo o quarteirão
Ele era meu melhor amigo.

À tarde,
Corríamos juntos pelo quintal empoeirado,
Brincávamos. 
Eu subia nas suas costas
E pedia que me contasse uma história 
As aventuras de Ali Babá e seus ladrões...
Ele me amava
E eu era a criança mais feliz do mundo.

Hoje,                                
Ergueram um grande prédio onde ficava minha casa.     
Uma multinacional com mais de mil andares
Progresso do país  
Sua sombra nem sequer atravessa a rua.
Rivaldo Júnior

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Ne Me Quitte Pas (Jacques Brel)

Ne me quitte pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit déjà
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
A savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
A coups de pourquoi
Le coeur du bonheure


Moi je t'offrirai
Des perles et des pluie
Venues de pays
Où il ne pleut pas
Je creuserai la terre
Jusqu'après ma mort
Pour couvrir ton corps
D'or et de lumière
Je ferai un domaine
Où l'amour sera roi
Où l'amour sera loi
Où tu seras reine


Ne me quitte pas
Je t'inventerai
Des mots insensés
Que tu comprendras
Je te parlerai
De ces amants-là
Qui ont vu deux fois
Leurs coeurs s'embraser
Je te racontrai
L'histoire de ce roi
Mort de n'avoir pas
Pu te rencontrer


On a vu souvent
Rejaillir le feu
De l'ancien volcan
Qu'on croyait trop vieux
Il est paraît-il
Des terres brûlées
Donnant plus de blé
Qu'un meilleur avril
Et quand vient le soir
Pour qu'un ciel flamboie
Le rouge et le noir
Ne s'épousent-ils pas


Ne me quitte pas
Je ne vais plus pleurer
Je ne vais plus parler
Je me cacherai là
A te regarder
Danser et sourire
Et à t'écouter
Chanter et puis rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
 

Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

domingo, 2 de janeiro de 2011

O palco da vida


      A busca do sentido da vida sempre assombrou a consciência humana. As respostas para perguntas simples com: “Porque tudo isso?” e “Para quê?”, jamais foram encontradas. Séculos se passaram e gerações se sucederam sem que houvesse a menor certeza de o que aconteceria amanhã. Do pó viestes, ao pó voltarás. As marcas deixadas por nossos atos são as únicas heranças que sobram para o mundo que nos gerou. 
      Talvez o tempo, essa força que nos envelhece e mata, ou as ocupações, cada vez mais corriqueiras de uma sobrevida apressada, têm tornado o modo de vida mais fútil e desvalorizado. Sorrimos menos, vivemos menos. Estamos sempre apressados em meio a uma avalanche tecnológica. Somos cada vez mais cobrados e classificados. Devemos obedecer o rigoroso sistema que nos aprisiona. Caso o contrário, somos jogados à margem, excluídos da sociedade. Como marionetes, somos presos por nós mesmos na nossa trivial luta cotidiana.
      O dramaturgo inglês Charles Chaplin comparava a vida a uma peça de teatro que poderia, ou não, terminar em aplausos. A escolha caberia, portanto, a cada um de nós. Lançados como sementes na Terra, somos único e exclusivamente responsáveis pelos frutos que geraremos amanhã. E assim, pois, se constrói a sociedade contemporânea. A nossa realidade é consequência da atuação de todos os seres no palco terrestre. E a vida, essa aventura improvisada, é o enredo que escrevemos a cada dia de acordo com as ocasiões e as escolhas que seguimos em meio ao conjunto social.
      Uma famosa música diz: “Viver é não ter a vergonha de ser feliz...”, porém é mais que isso; é optar pela felicidade e aproveitar ao máximo cada momento, antes que as cortinas se fechem e o espetáculo termine sem aplausos. 

Rivaldo Júnior